Umbigo de Eros

Te convido para sentar no sofá vermelho de Eros... Vamos escarafunchar os Umbigos!

28.7.11

ALEATORISMO

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foto aleatoriamente sugerida por jhcordeiro.


Desapego mesmo é permitir o “aleatorismo” (termo inventado por um amigo, já que não existe no dicionário). Tipo sair de casa sem saber pra onde, deixar-se levar. Permitir o inusitado. Qualquer hora você vai lembrar-se de um lugar legal, vai ver uma placa sei lá, no máximo, volta pra casa. É o aleatorismo, quase primo da Lei das Probabilidades, da Física Quântica, onde tudo pode acontecer. Será parente também da Sincronicidade?


Imagina passar meses montando uma playlist pra festa super dançante, você estuda minuciosamente as melhores transições, que música dá melhor seqüência pra outra, escuta mil vezes, faz mudanças cotidianamente, até que um belo dia considera que alcançou a melhor composição, ufa! Chegando à festa, você resolve deixar o CD tocar no modo aleatório ou randômico. Quer desapego maior? Certamente, depois da primeira música, você vai querer controlar a coisa, principalmente se a pista esvaziar, mas se conseguir permitir... Ilumina!

Tô falando aqui de momentos onde desapego é sabedoria. Mas sem essa bandeira ao desapego exagerado! Hoje em dia o apego é o grande vilão, no entanto, no dicionário, é sentimento de afeição, de simpatia por alguém ou alguma coisa, e tem como sinônimos, afeto, amizade, amor, benevolência, fraternidade, simpatia, ternura... Então cuidado ao destruir seus apegos, afinal a vida se faz de vínculos, de apegos, de Eros... Sou apegada aos meus afetos, amores, amigos, à minha casa, às minhas coisas... Se eu as perder, suportar a perda não será exercício de desapego (ou desinteresse, falta de amor) e sim de maturidade, já que desde sempre soubemos que tudo um dia vai morrer, vai findar... Nunca fomos enganados a esse respeito.

Já no aleatorismo o desapego é ingrediente vital, já que pressupõe o desinteresse em controlar, em acertar, em garantir qualquer coisa. O lance é permitir que a melhor escolha nos escolha. Confesso: eu vivi a saga da playlist citada acima! E, com um agravante: eu tinha um parceiro, que também havia gravado a sua, e ambas deveriam se harmonizar em uma hora de discotecagem! Definimos previamente que a dele tocaria primeiro.  No entanto, na hora H, cogitamos o aleatorismo, movidos pela ansiedade de que as músicas não agradassem, claro! Bom, eu sim, ele não sei, já que é anarco-budista assumido e nunca dá pra saber muito bem o que se passa com ele...

Graçasaosdeuses, não optamos nem pela ordem estabelecida e muito menos pelo randômico. Fomos mexendo tudo, ali, ao vivo, jogando as músicas, curtindo-as e dançando simultaneamente... E sem perceber, fomos Djs e, ao mesmo tempo, convidados, já que a parceria nos permitia também dançar as nossas músicas - Djs interativos! Ao final, meu parceiro pareceu feliz. Pra ele, a nossa escolha também foi fruto do aleatorismo. Talvez tenha razão. E viva o anarco-budismo!

E viva festa, o ambiente mais aleatório que conheço, onde, tudo pode acontecer, e acontece mesmo! ( Babados só revelo sob tortura!) Onde o ser brincante, gaiato e alegre que nos habita, mostra as caras e nos diverte, merecidamente numa epifania coletiva!  E viva o Adriano, em seus 40 anos de vida, que pretendeu fazer uma festa que, ao final, virou rave! Olha o aleatorismo aí de novo! E viva a Amy que deve tá fazendo festa no céu, ou no inferno, ou em outro lugar aleatório do espaço! 

Saiba mais sobre anarco-budismo: http://pt.wikipedia.org/wiki/Anarquismo_budista

Namastê

Anasha
Bsb julho 2011  


















desarvorar (de-sar-vo-rar)

v.t.Náutica Tirar os mastros a 
(uma embarcação).
v.i.Fugir atropeladamente; safar-se.
v. pr.Desnortear-se,
ficar desorientado.
Inquietar-se; exaltar-se; 
espavorir-se.



Sou uma desarvorada, sem dúvidas. 
Tem a ver com desejo? Sempre.
Com ciclo mensal? Certamente.
Me desoriento, me inquieto, perco o mastro e sigo à deriva...


É o momento em que não tolero mais alguém, alguma coisa ou alguma situação. E o basta vem mais forte que um furacão, basta! Sem vista grossa, sem cumplicidade... Ao mesmo tempo, gosto de ver a minha força se colocando dessa forma, impondo limites duramente porque foi necessário. Quantas vezes me calei pra não causar confusão? E fiquei ruminando aquilo, me enchendo de um troço que nem era meu...


Nessa intolerância, o corpo fala mais rápido que a mente, que é o que mais adoro! Brota uma sinceridade ontológica e celular! Dá medo porque não dá pra controlar, e esse é também o grande barato. Vem como uma possessão, que se for dirigida pro alvo certo, vira benção, cura. Se compulsão, vira violência gratuita, doença. Uma linha extremamente tênue as separa. 

As grandes peias de “desarvoramento” que levei da vida foram sempre cíclicas. Num primeiro momento, vitimizada, sou jogada na rua da amargura, do abandono. Pra sair dessa lama, só uma energia muito forte. Então sou reerguida pela raiva, pela incompreensão que brota de um profundo sentimento de injustiça que alcança Deus, a divindade dentro e fora de mim. Minha fé é abalada. Sem fé, sou empurrada pro livre arbítrio, e assumo as consequências dos meus atos, ui! Fardo solitário e pesado esse de assumir o próprio destino!  Deus então se faz necessário, já que acreditar suaviza, humaniza... Peço colo pra Deus e me reconecto. Mas se eu ficar muito tempo sentada aqui, capaz de não levantar nunca mais, fui! E perco a conexão sendo novamente lançada ladeira abaixooooooooo. Desarvoramento existencial!

O desarvorar feminino é assim, meio bipolar, quica entre dois pólos e nunca consegue perceber que há um “entre”... É intenso, quente... O corpo quer contato mas, sem tato, acaba trombando nos outros corpos, sendo frio e metálico... Quando na verdade queria tocar, sentir, sentir-se, permitir... Caçamos algo pra nos dar limite, pra comprimir tamanho descontrole, pra abraçar nos delimitando... E queremos briga sim, mas essa visceral, essa que vejo nos meus sobrinhos e no meu filho quando se atracam no chão, “brincando” de lutinha! Não entendia isso. Se machucam, choram, mas continuam ali no chão, rolando e se batendo. Hoje invejo isso.

Se nos fosse estimulado na infância esse “atracamento”, quem sabe  fossemos menos desarvoradas... Também precisamos dessa mistura de adrenalina, com afeto e contato, poxa! O futebol tem isso também... Essa integridade corporal no homem eu invejo. Acho todos os homens mais encarnados em seus corpos do que nós mulheres. Podem ser o que forem, mas moram em seus corpos... Nós podemos até morar um tempo, mas qualquer furacãozinho nos tira dele. E lá vamos nós buscar a cabeça rolante pra juntar num corpo, que, muitas vezes, nem reconhecemos como nosso...

Enfim, nos momentos de desarvoramento, a insatisfação é tempero garantido. Seja como doença, quando entro na eterna e repetitiva queixa ao outro, para que me restitua aquilo que me faltou. Ou então como provocação, na exigência de uma satisfação além do limite comum, que não se contenta com a demonstração de afeto do homem. E peço ainda mais, mais além das evidências. Por outro lado, se não fosse esses eventuais ataques de insatisfação, talvez ainda estivéssemos morando em cavernas. Tem algo de visionário na insatisfação feminina, vai.

Dias depois de toda essa crise, menstruei! Era mesmo TPM, da braba! Desarvoramento mensal!


"Não entendo, apenas sinto. 
Tenho medo de um dia entender e deixar de sentir." 
Clarice Lispector

Anasha
Maio 2011