Ei,vem cá. Vem cá todo mundo!
É chegada a hora de cessar o lamento
De tirar o lenço e balançar ao vento
Acabou o tempo de interpretar!
A lavadeira chorona, a velha das galinhas, a menina moça, a doidinha,
A pobre coitada, a curandeira, a rameira, a rezadeira... Esse povo todo surgiu de trás das cortinas do tempo, de trás dessa pele fina, que recobre nossos seios, nosso ventre, nossa língua... Esse povo que saiu da memória celular, muscular, sei lá. De muito longe, de tão perto, tão incerto.
Do início da vida
De antes da mulher que veio do barro
Do tempo da mulher que veio primeiro
Nesse tempo do sonho, onde tudo é possível,
Foi feita uma reunião
Com as mulheres originais:
Nossas ancestrais!
Guardiãs do passado, que se faz presente na gente
Passado que sem o novo vai virar futuro
Porque já se sabe: se o novo é impedido tudo é repetido.
Por isso a reunião!
Saber o que se deve guardar e levar consigo
E o que é velho por demais, carcomido
Separar o joio do trigo
Matar o que deve morrer
Dar a vida ao que vida possui
Foi no tempo do sonho
Que nós, mulheres modernas, de computadores, diplomas,
Carros, freezers e microondas,
Mergulhamos nas nossas crisálidas de tecido
Nas colchas que formam nossas vidas
Costuradas pelas antigas
Cada retalho escolhido, cada fio repartido,
O jeito de distribuir as cores, os amores,
O modo de abrir ou fechar as pernas, de fechar ou abrir o coração,
Tudo isso foi traçado pela mão, pelo pé, pela pele, pelo corpo da mulher.
Nossa maior jóia
Lapidada pelas mulheres mais importantes da nossa história
Nossas mães, avós, bisas, tatás, quintas-vós
E a toda a mulherada,
Obrigada por tudo o que vivemos nessa jornada!
Texto escrito durante o processo de criação do espetáculo "Crisálidas"