Matutando acerca da viagem da segunda metade da vida - parte 2", me pego rindo
porque daqui pra frente essa será minha estrada, até a parte que me caberá
viver. Enfim, seguindo na vibe da reflexão sobre chegar e até ultrapassar a metade da vida, e
todas as questões filosóficas, existenciais, corporais, psicológicas e
espirituais que o fato suscita, percebi, essa semana, um movimento
interessante.
Em um nível intensamente sutil, a vida já vem me empurrando prum
novo lugar (em mim) há alguns anos, durante os quais a luta foi (e segue sendo) ferrenha. Velhos sonhos e ideais perdendo o sentido, assim como práticas,
atitudes, lugares e até pessoas. Mas eu me negava a ver e insistia, batia de
frente, me rebelava, tentando manter meu status
quo construído à duras penas, enquanto a vida, numa onda tsunamica
invisível, queria detonar com tudo... O tsunami continua aqui, acontecendo,
constantemente, dia a dia, minuto a minuto. Mas paralelamente à devastadora
desconstrução da velha colcha, sinto que há uma outra sendo costurada em algum
nível. Talvez esteja pequenina ainda mas ela caminha, a seu tempo, para fazer-se viva. Tudo isso se dá num
outro Tempo, no tempo da meia idade. Esse que só compreendemos na meia idade!
A vida nos conduz para o centramento, para a meditação, para uma vida mais
calma e equilibrada, porém, há um lado
em nós que esteve e ainda está desesperado com tudo isso, porque lê esse
movimento como ENVELHECIMENTO. Claro que se apegou a um só dos lados do
conceito, o lado sombrio do envelhecer que é o deixar de brincar, de sorrir,
de cantar, tornar-se sério, triste, chato e resignado, o velho ou velha mal
humorados e ranzinzas de nosso
imaginário clássico. Esse é um dos fantasmas da meia-idade, o medo do envelhecer do
espírito, que é muito mais profundo do que o do corpo.
A força oposta é a da JUVENTUDE, e que justamente por se colocar
em oposição (e não em complementação) já vem compulsiva na busca por prazeres, alegrias
e ilusões. E talvez a fuga de certas responsabilidades para com a gente mesmo e nosso bem estar. E assim acionanos também o lado sombrio da juventude. De
fundo, sem saber, buscamos o equilíbrio entre os arquétipos do Senex
e do Puer. Essa é uma luta antiga, a
luta das polaridades, que antes se dava entre a normose e a busca por originalidade, e a vida
se dividia entre os chatos normóticos e os loucos buscadores. Hoje a briga é mesmo entre a velhice e a
juventude, dois lados da mesma moeda, complementares em essência. Sigo, observando o processo, amorosamente, buscando alcançar e acolher também o lado luz de cada um.
Hoje me sinto ENTRE, meu lugar do agora. Lugar da mulher de 43
anos, que carrega em si tanto a calmaria, a sabedoria e a fé próprias do
amadurecimento e do tempo já vivído, com a entrega e o amor que só o envelhecer
proporciona, nadando em meu ritmo próprio, ao mesmo tempo em que vivo também a
curiosidade, a disposição, a indignação da juventude, que questiona, que
inventa, que dança, que se apaixona e que investe nos sonhos porque os tem. Ainda dá xabu, na maioria das vezes, mas, sigo tentando fazer com que a luta vire dança!
Difícil mesmo é apaziguar os ânimos dessa gente interna que quando
resolve ir pra briga, faz estragos demais por acreditar que uma postura exclui a outra. Aprendemos a excluir e não a incluir. Excluir dá
sensação de poder e incluir parece fraqueza, o que me lembrou do conto "A
princesa que era alta demais", que assim, como "Alice no país das
maravilhas", nos fala sobre encontrar nosso próprio tamanho, natural, nem
maior nem menor do que ninguém. Quando trabalho esse conto, proponho uma
vivência corporal sobre sentir-se pequena, natural e
grande. E a fala da maioria das mulheres com as quais já trabalhei é de que o
sentir-se grande inclui sensações boas enquanto apequenar-se só traz sensações
negativas. Parece haver algo errado ai. Parecer maior, mais importante, mais
inteligente, mais bonita, foi o que aprendemos a almejar, sem nenhuma
consideração para o fato de que estar no alto me afasta de quem, supostamente, está abaixo, e impede qualquer relação real.
Enfim, sentir-se grande ou pequena pressupõe comparação. Só me
comparando pra poder avaliar. Mas enquanto seguimos nos comparando aos outros,
o véu de maia continuará nos cegando. Só podemos nos comparar a gente mesmo, antes. Aí sim podemos avaliar se estamos maiores ou menores do que já estivemos. Enquanto o parâmetro for o outro, esquecemos de
procurar, encontrar e acolher o que realmente importa: nosso tamanho natural, ser
quem somos de verdade!
Bem vind@s a meia idade! E pros que não
chegaram lá, espero que cheguem. Como cantou Arnaldo Antunes, na música
Envelhecer: "(...) Não quero morrer pois quero ver como será que deve ser envelhecer. Eu
quero é viver pra ver qual é e dizer venha pra o que vai acontecer (...)".
Namastê
Anasha
Link da música:
https://www.youtube.com/watch?v=MHgcQ76vRM8