Umbigo de Eros

Te convido para sentar no sofá vermelho de Eros... Vamos escarafunchar os Umbigos!

Escrevo sob o impacto do filme Another Earth. Muitas lágrimas e emoções, vindas, certamente, da Outra Terra que há em mim... Hoje, é disso que o filme falou, pra mim. Amanhã, com certeza, será uma nova leitura, já que se trata mesmo de um grande filme, com um grande tema, amplo, profundo, quase indizível. Uma obra de arte dessas que nos conduz, de um modo muito visceral, às grandes questões da existência: Morte, Amor, Culpa, Reparação, Transformação, Impermanência, Beleza... O filme mostra como aquilo que há de mais vivo em nós só se faz visível nos momentos de profunda morte. 

O diretor Michael Cahill, denomina-o como "um drama de ficção científica indie épico minimalista", talvez tentativa de alargar o conceito do filme, realmente amplo nas questões que aborda. A história gira em torno da descoberta de um novo planeta, uma espécie de Terra duplicada, onde tudo daqui é reproduzido e espelhado, inclusive nós todos. Uma missão é montada e pessoas se candidatam a viajar até lá, exumando perguntas ontológicas, que, de fundo, podem resumir-se numa única: O que eu diria/faria ao encontrar comigo mesma? Se houvesse esta possibilidade, eu gostaria muito de me olhar com o carinho, condescêndencia e curiosidade com que olho o outro. E sob privilegiada perspectiva, e percebendo, profundamente, minha beleza e meus dons, me apaixonar perdidamente por mim... E cessaria a divisão. E viveria, finalmente, numa única terra... Enfim, A Outra Terra me fez viajar.

Os protagonistas sofrem perda irreparável: Ele, a família, ela, a garota que fora antes de causar o acidente fatídico que matou a família dele. Interessante acompanhar os trajetos internos de ambos, em meio a paisagem externa sempre nublada. Seria metáfora da falta de sentido da vida? Desses momentos quando os matizes das cores entram em greve e tudo se faz e se vê insosso, sem sabor, sem vida? O cinema tem dessas coisas... Os dois são lançados ao duplo em si, já e sempre presente, mas até então, invisível (ou visível em sua analogia com o planeta que veem a olho nu tão próximo da Terra). A sombra, o obscuro e desconhecido, é trazido à luz juntamente com a própria luz, a mais límpida e sagrada que guardavam escondido na Segunda Terra em si... Ela, do choque e da culpa, e ele, do choque e do ódio, alcançam, por caminhos internos distintos e misteriosos, o amor. E, talvez só tenham alcançado porque não o buscaram, já que o amor enredou-os, costurou-se neles a partir do umbigo de uma outra Terra...

Também interessante e, de novo, constrangedor, acompanhar a dicotomia amor-ódio no protagonista, que se vê amando (sem saber, numa espécie de cegueira simbólica) aquilo que acreditava mais odiar: A pessoa que matou sua familia. Assim, a lógica e a razão acusam sua própria insuficiência exumando os mistérios da vida e do próprio amor... 

Mas o personagem mais interessante do filme é mesmo o faxineiro indiano, Purdeep, cego (realmente) e também muito sábio, de uma sensibilidade absurda, capaz de sentir e perceber para além do conhecido. No desenrolar da trama ficamos sabendo que sua cegueira foi causada por ele mesmo (Cansou-se de se ver em todo lugar), assim como a eminente surdez, já que ele joga alvejante nos ouvidos tornando-se surdo. Numa das cenas mais belas do filme, vemos que, ainda assim, ele segue, para sua agonia, vendo e ouvindo, de outros modos, exalando o perfume sutil dos sentidos escondidos por traz dos sentidos... 

E você, o que você diria pra si ao encontrar consigo mesmo(a)? 

Segue o trailer do filme:http://www.youtube.com/watch?v=N8hEwMMDtFY

Namastê

Anasha